quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Sobre desemprego e como entendi o trabalho depois disso

Como desempregada por um período de 6 meses, posso oferecer alguma perspectiva sobre o mercado de trabalho atual e como procurar emprego se tornou uma espécie de relacionamento abusivo com algumas empresas. Quero contar experiências e detalhes de como cheguei a me encontrar dando aulas de inglês e me sentindo feliz durante o processo. Pega a pipoca e senta que lá vem história.

Primeiramente, o tal do seguro desemprego e dos benefícios recebidos dão um certo quentinho no coração angustiado do recém desempregado. Apesar disso, tive que modificar toda uma dinâmica de vida e esclarecer melhor alguns limites para não perder a sanidade. Ser encarcerado após um período de liberdade nunca é algo fácil, mas você aprende a conviver e ligar o belíssimo botão do "DANE-SE" para não ligar o do "SURTEI". Graças aos meus aprendizados sobre dinheiro e o grandessíssimo privilégio de ser CLT (já citado anteriormente), tinha uma reserva disponível pra poder me virar por algum tempo.

O tempo desempregada me assustava diariamente. Era estranho sair de uma rotina pré estabelecida de trabalho e voltar para uma similar a de estudante, dado que logo após a demissão comecei a estudar para alguns concursos. O resumo da ópera foi que me senti exatamente como no vestibular, mas era muito, MUITO, MUITO mais concorrido. Só apareci no quinto lugar em um deles, de uma cidade próxima a Presidente Prudente, em cadastro reserva. Ou seja... Gastei uns bons dinheiros e tempos que não renderam muito resultado.

Algumas alternativas de renda extra surgiram, mas me descobri incrivelmente PÉSSIMA vendedora. Continuo apenas com catálogo de lingerie por ser uma marca e um produto que eu pessoalmente gosto e que vale a pena, financeiramente falando. Deus abençoe as vendedoras de cosméticos por catálogo, eu realmente ainda não consegui desenvolver talento suficiente para tal. Além disso, aleatoriamente, cheguei a trabalhar como atendente de papelaria, mas por uns problemas de saúde não durei nem uma semana na função e novamente, meus parabéns para todos os vendedores e comerciantes por que não é nada fácil trabalhar o dia todo em pé, no calor e atendendo cliente confuso. Toda essa experiência me fez ter MUITO mais respeito e empatia (do que eu já tinha) por esses profissionais e perceber o quão privilegiada sou por ter outras alternativas além dessas.

As experiências citadas acima dependiam quase que exclusivamente do meu desempenho e dedicação, mas meu amigo, se você está no mundo de entrevistas e envio de currículo, deve saber que não é NADA fácil contar com o RH das empresas. Tive exemplos bons, ruins e PÉSSIMOS e seguirei lhes contando mais sobre eles.

É claro que contaremos primeiro o péssimo, por ser o que mais me marcou. Fiz duas vezes a mesma entrevista, uma vez diretamente com a gestora da loja e outra com uma empresa de RH. O melhor dessa história: não tive retorno em nenhum dos casos. Juro que, se hoje a empresa ou um RH que a represente me ligar vai tomar um xingo bem educado para entender que o tempo e o dinheiro dos outros não é mato, especialmente se você está desempregado. Tento ser uma pessoa equilibrada, mas a falta de respeito realmente me tira do sério. Inclusive, mesmo que a loja preste um serviço excelente e de qualidade, jamais a recomendaria. Descobri que a maneira como você trata os funcionários (e os futuros também) é um reflexo imediato do funcionamento da empresa e essa claramente não exala responsabilidade nem respeito com o próximo, características indispensáveis pra mim.

Outro caso peculiar é o de uma empresa antiga no mercado em Americana, que entrou em contato no ano passado sobre uma vaga de estágio (na qual eu não me qualificava). Tinha enviado meu currículo por email e expliquei a situação pelo telefone, dizendo que já era formada. Como calhou de ser nos dias do trabalho na papelaria, fiz a entrevista por telefone, explicando a situação ao gestor, que me informou a tal da contratação MEI para casos como o meu. Surtei. Não sabia como seria resolvida a papelada, perguntei pra Deus e o mundo e no fim das contas entendi que engenheiro mesmo não pode ser MEI. Mas analista de planejamento ou algo do tipo pode. Fiquei no aguardo do retorno. Duas semanas depois entrei em contato e, não para minha surpresa, a vaga tinha sido preenchida por outra pessoa. Esse ano, enquanto estava fazendo uma visita de um freela de engenharia, o mesmo gestor me mandou mensagem perguntando se eu ainda estava interessada. Pedi para que ele marcasse a entrevista. Até hoje nem sinal. Quem já foi solteiro por muito tempo sabe EXATAMENTE que esse é o tipo de comportamento daquelas criaturas abençoadas que te deixam como backup e só lembram que você existe depois de se sentirem sozinhas e tristes. Sei que pode ter acontecido uma falha de comunicação entre o gestor e o RH, ou que talvez eu realmente não seja qualificada pra vaga. Ainda assim, era meu direito ser comunicada.

Uma situação inusitada ocorreu com outra empresa pequena de engenharia aqui em Americana mesmo.  Fiz a entrevista ano passado para um cargo administrativo e o responsável escolheu outra pessoa por conta do meu currículo, me prometendo que assim que surgisse uma vaga na área de engenharia, o que seria breve, ele me chamaria antes de abrir para outros candidatos. E assim o fez. Ainda estamos conversando e ainda estou avaliando a ideia, mas a honestidade é sempre o que me chama atenção, especialmente em entrevistas de emprego.

De feedbacks positivos pós entrevistas só tive 2. Uma empresa em Campinas cumpriu com o prometido e me avisou que eu não era qualificada para a vaga por email. Também pudera: não tinha experiência pra vaga. E pra finalizar o papo, outro feedback positivo foi feito pela empresa em que estou trabalhando agora, ainda como experiência, dando aulas de inglês. Sim, uma engenheira dando aulas de inglês, por que não? A entrevista foi extremamente honesta, o tratamento como empregada é extremamente respeitoso e estou muito satisfeita me descobrindo professora, trabalhando tranquila transmitindo conhecimento e no ar condicionado, extremamente diferente de um ambiente de obra. Não imaginava ser apta a dar aulas de inglês, mas estou feliz por descobrir essa nova habilidade. Vale ressaltar que não tive aulas de inglês em escolas particulares (exceto as da escola comum) e aprendi muito no feeling, mas é difícil. Desde os 12 ou 13 anos que me dedico a entender o que falo/escuto em músicas, filmes e séries. Acho válido o processo de aprender inglês mais rápido, diferentemente de como aprendi, e estou gostando MUITO do método apresentado a mim para ensinar. Como curiosa por conceitos de psicologia, também posso entender umas coisinhas a mais nesse processo.

Depois de todas essas experiências, tenho entendido e enxergado o trabalho de outra forma. Hoje (espero não ter esse discurso no futuro), devidas as exceções, a mão de obra de engenharia está sendo escancaradamente explorada. Uma profissão que te exige 5 anos de graduação e experiência na função tem como salário R$ 2.000,00, o que não dá 2 salários mínimos. Garanto que o salário não passa de R$ 3.000,00 em 90% das vagas oferecidas a engenheiros junior ou os famosos ANALISTAS de engenharia, que quem é da área sabe que esse cargo só serve pra poder te pagar um salário inferior ao de engenheiro, ainda que você exerça a mesma função. Nessa vibe de vaga de analista, desisti de uma dinâmica de entrevista que aconteceria em um sábado. Já tinha viagem programada há uns CINCO meses, e coloquei na balança se valia a pena. Decidi que não. Tomara que outra pessoa seja feliz na função.

A gente só entende, de fato, a luta quando a bomba cai no nosso quintal. Hoje entendo melhor o lamento de professores, que são profissionais tão necessários e tão mal pagos. O trabalhar o tempo todo sem retorno financeiro ou profissional permeia nossas realidades de forma dura e constante. Muitos dos discursos que ouço de amigos têm essa narrativa. Felizmente, alguns andam se descobrindo profissionais incríveis, balizando o que compensa e o que se dispensa na profissão. Para quem ainda tem, lá no fundo, o sonho de mudar realidades através do mercado da construção civil eu desejo muita motivação e esforço, mas lamento informar que às vezes essas características vão te deixar acordado várias noites e pode ser difícil fazer as contas fecharem no fim do mês. É triste ser realista e te informar isso mas... sua carreira dos sonhos pode não ser o suficiente pra pagar seus boletos. Você está disposto a enfrentar essa realidade?

Eu, por enquanto, sigo me descobrindo como profissional, na engenharia e fora dela. Meu destino não é mais escrito em pedra, mas meus caminhos agora buscam colocar meus sonhos em metas para que se tornem reais. Meu discurso de estar feliz dando aulas cala a boca de muita gente. Quem está mal intencionado vai ter mais dificuldade de te criticar se você está feliz, é impressionante. Além disso, aprendi a compartilhar novidades com quem me apoia ou me alerta caso eu esteja entrando em uma fria sem perceber. São poucas e boas pessoas assim na minha vida. Quero utilizar essa nova visão de trabalho, um lugar pra ser respeitado e recompensado de acordo com o seu esforço, para tomar decisões profissionais e ter equilíbrio nessa área da vida também.

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